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Editorial

Terceirização - será que agora vai?

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Terceirização - será que agora vai?

É inacreditável. O Congresso Nacional discute há 17 anos o tema da terceirização e até hoje não conseguiu regular a matéria. Lembro-me bem do Projeto de Lei n.º 4.302, apresentado pelo Poder Executivo em 1998. As discussões foram infindáveis. O projeto passou na Câmara dos Deputados, foi ao Senado, voltou à Câmara e ali morreu. Depois disso, o assunto foi objeto de várias proposituras. Até hoje, nada.

Nesses 17 anos a terceirização se generalizou no mundo, avançando a passos largos na indústria, no comércio, nos serviços, na agricultura e no setor público. A combinação de tecnologia com terceirização alavancou a competitividade das empresas, reduziu o preço dos bens e serviços para os consumidores e gerou muitos empregos para os trabalhadores.

Os países avançados terceirizam de tudo, em seu próprio território, em outras localidades e até mesmo na nuvem, como é o caso dos serviços de secretaria remota, atendimento aos clientes e execução de tarefas repetitivas (Terceirização virtual, Folha de S.Paulo, 16/3). Enquanto isso, nós, brasileiros, discutimos se a terceirização deve abranger ou não a atividade-fim. Irrelevante, pois o mais importante na terceirização é garantir proteções aos trabalhadores que dela participam.

Nada justifica o enorme atraso do Brasil na regulação da terceirização. A produção moderna é realizada em cadeias produtivas que otimizam especialidades por uma razão muito simples: ninguém é capaz de fazer tudo sozinho. O trabalho passou a ser feito em equipes, unindo parceiros e dividindo responsabilidades. Assim é no mundo inteiro. A Toyota do Japão trabalha com 500 fornecedores que, por sua vez, se associam a 2 mil empresas especializadas, que no conjunto produzem um veículo campeão mundial de vendas, com um preço atraente e qualidade convincente. Como resultado, os investimentos crescem e os empregos se multiplicam.

Não há o que discutir. Imagine qual seria o preço de um apartamento se a construtora, em lugar de contratar serviços de terceiros especializados, tivesse de realizar todas as atividades com profissionais próprios, que, ao completar suas tarefas, ficariam na ociosidade o resto do tempo. O preço seria uma exorbitância. Pobre consumidor!

O tema da terceirização foi suficientemente debatido entre nós. O Projeto de Lei n.º 4.330, que tramita no Congresso Nacional desde 2004, já passou por inúmeras avaliações. Não é o projeto dos meus sonhos. Mas ele garante as proteções de que os trabalhadores necessitam e dá segurança jurídica a quem contrata seus serviços.

As proteções ali contidas vão muito além da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) e da Súmula 331 do Tribunal Superior do Trabalho (TST). Sim, pois nenhum desses diplomas estabelece com eficácia a corresponsabilidade das empresas contratantes e das contratadas. Tampouco garante as condições de saúde e segurança aos trabalhadores das prestadoras de serviços terceirizados e a proteção dos seus empregados na hora do acidente ou da doença ocupacional. Nem estende a eles as facilidades de alimentação e de transporte da empresa contratante, como faz o referido projeto de lei.

Na sua fase final de tramitação, impõe-se a eliminação de alguns conceitos (poucos) que ali foram maliciosamente incluídos por quem é contra a terceirização. Eliminadas essas imperfeições, a nova lei afastará os aventureiros que hoje se valem do vazio da legislação para contratar trabalho de modo desumano, precário e indigno.

É claro que a lei em si é insuficiente para a implantação do trabalho decente. Mas, ao estabelecer regras claras, ela se tornará uma importante ferramenta para a fiscalização e para a Justiça agirem com efeito moralizante.

Espero ver em 2015 uma regulação sensata nesse campo. Afinal, a terceirização está aí. É parte da realidade. O prioritário é proteger os desprotegidos. Essa é a função da lei e das instituições do trabalho.

José Pastore é presidente do Conselho das Relações do Trabalho da FecomercioSP.
Artigo publicado no jornal O Estado de S. Paulo em 24/3/2015, página B02.

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