Editorial
26/12/2025A postergação do acordo Mercosul–UE e seus custos estratégicos para o Brasil
O atraso europeu compromete a integração do País às cadeias globais de valor, afeta investimentos e limita ganhos de produtividade essenciais para o crescimento sustentável
Por Rubens Medrano*
A postergação da assinatura do acordo com o Mercosul por parte da União Europeia (UE) é um episódio que transcende a esfera comercial. Em um sistema internacional pressionado pela polarização entre China e Estados Unidos e pelas incertezas de novas diretrizes na nação norte-americana, a consolidação dessa parceria é de suma relevância para integrar o Brasil como um protagonista nas cadeias globais de valor.
A Federação do Comércio de Bens, Serviços e Turismo do Estado de São Paulo (FecomercioSP), fiel à sua trajetória em defesa de uma abertura comercial criteriosa e responsável, observa com preocupação o fato de que, após duas décadas de esforços diplomáticos, as negociações tenham encontrado resistências domésticas de alguns membros europeus. É lamentável que pressões setoriais localizadas ainda prevaleçam sobre uma visão de Estado moderna, mantendo vivo um protecionismo que se mostra anacrônico diante dos benefícios que o acordo trará para o desenvolvimento do bloco econômico europeu.
Os números não deixam margem para dúvidas sobre a relevância dessa relação: a UE é o segundo maior parceiro comercial do Brasil, com um intercâmbio que atingiu a marca de US$ 95 bilhões em 2024, abarcando uma população de mais de 700 milhões de pessoas e responsável por metade do investimento direto externo em nosso solo. O acordo não representa, por sua vez, uma via para o escoamento de produtos, mas um catalisador de produtividade, inovação e redução de custos operacionais para as empresas brasileiras.
“Ao adiar o acordo com o Mercosul, a Europa não apenas fecha portas ao Brasil — compromete sua própria relevância em um mundo cada vez mais multipolar.”
O distanciamento de certos governos europeus dessa convergência econômica contrasta com as lições da história recente. Enquanto economias dinâmicas buscam a eficiência por meio da integração, o retorno a barreiras tarifárias e não tarifárias costuma punir o consumidor nacional e diminuir a competitividade industrial.
O tratado vislumbra um horizonte ambicioso — a desoneração de 90% dos produtos em um ciclo de 15 anos. Do agronegócio de precisão à manufatura de alto valor agregado, os benefícios serão mútuos e profundos. O sucesso das negociações do acordo assinado em 2025 entre o Mercosul e a Associação Europeia de Livre Comércio (EFTA) — que reúne a Suíça, a Noruega, a Islândia e a pequena Liechtenstein — prova que, quando há pragmatismo e vontade política, um tratado pode caminhar e evoluir sem percalços.
Em suma, a FecomercioSP reitera que o Estado brasileiro cumpriu o seu papel nessa etapa de integração internacional. A persistência de visões protecionistas em alguns países europeus não apenas priva o Mercosul de oportunidades valiosas, mas também ameaça as relevâncias política e econômica da UE num mundo cada vez mais multipolar. A esperança é que a UE consiga contornar, em curto prazo, as dificuldades que deram causa à postergação a fim de que o processo de assinatura seja concluído definitivamente.
O Brasil demonstra prontidão e comprometimento com a promoção diplomática para o futuro, cabendo aos nossos parceiros europeus decidirem se preferem o isolamento ou as vantagens da parceira.
*Rubens Medrano é presidente do Conselho de Relações Internacionais da Federação do Comércio de Bens, Serviços e Turismo do Estado de São Paulo (FecomercioSP).
Rubens Medrano, presidente do Conselho de Relações Internacionais da FecomercioSP