Lidar com a escassez de água exige ações em múltiplas frentes: políticas públicas baseadas em monitoramento e transparência; investimentos em infraestrutura e interligações entre bacias; e conscientização
Por José Goldemberg e Cristiane Cortez*
A escassez de água deixou de ser um problema pontual para se tornar um desafio estrutural, no Brasil e no mundo. As recentes decisões, da Agência Nacional de Águas (ANA), que declarou situação crítica nos rios da Amazônia, e a estratégia da Sabesp de reduzir a pressão da água na Grande São Paulo, mostram que o país enfrenta desafios simultâneos — de um lado, a diminuição da oferta em importantes mananciais; de outro, a necessidade de garantir o abastecimento em grandes centros urbanos.
Na Região Metropolitana de São Paulo, a crise hídrica levou a Agência Reguladora de Serviços Públicos (Arsesp) a editar a Deliberação 1.704/2025, instituindo medidas emergenciais de prevenção e contingência. Entre elas estão a comunicação prévia de rodízios, monitoramento semanal dos reservatórios e fornecimento emergencial de água para hospitais e serviços essenciais. Essa normativa demonstra como a gestão deve ser integrada, considerando a segurança hídrica como prioridade.
Ao mesmo tempo, na Amazônia, a estiagem recorde compromete a navegabilidade dos rios, afeta comunidades ribeirinhas e ameaça o transporte de mercadorias. Esse contraste evidencia que a escassez hídrica não é apenas urbana, mas também atinge ecossistemas e os diversos modos de vida no Brasil.
Frente a esse cenário, a conservação da água no dia a dia torna-se indispensável. A cartilha da Federação do Comércio de Bens, Serviços e Turismo do Estado de São Paulo (FecomercioSP) lembra que desperdício significa prejuízo ambiental e financeiro. Pequenas atitudes — como consertar vazamentos, usar equipamentos economizadores, adotar reúso de água e treinar equipes para práticas conscientes — geram resultado coletivo relevante. No setor empresarial, estabelecer metas de redução de consumo e investir em tecnologias de eficiência hídrica são passos estratégicos, tanto para a sustentabilidade quanto para a competitividade.
O debate sobre escassez hídrica também envolve aspectos legais. A Lei Federal 11.445/2007 estabelece a obrigação dos prestadores de serviços de saneamento de garantir continuidade e qualidade mesmo em situações de contingência. Em nível local, leis municipais, como a que proíbe o uso de água potável para lavar calçadas na capital paulista, reforçam o princípio da responsabilidade compartilhada.
Assim, lidar com a escassez de água exige ações em múltiplas frentes: políticas públicas baseadas em monitoramento e transparência; investimentos em infraestrutura e interligações entre bacias; conscientização empresarial e cidadã. Mais do que uma questão técnica, trata-se de um compromisso ético com as próximas gerações. Afinal, a água é um recurso limitado — e sua preservação é condição para a própria sobrevivência.
* José Goldemberg é ex-ministro do Meio Ambiente e presidente do Conselho de Sustentabilidade da FecomercioSP; Cristiane Cortez é assessora do mesmo conselho.
Artigo originalmente publicado no jornal Diário do Comércio em 12 de setembro de 2025.
Inscreva-se para receber a newsletter e conteúdos relacionados