Economia
19/05/2025FecomercioSP se reúne com representantes do Congresso para apresentar posicionamento quanto ao Marco Civil da IA
Entidade se antecipa à instalação da comissão que vai debater a regulamentação da tecnologia e apresenta decálogo com propostas

No início de maio, a Federação do Comércio de Bens, Serviços e Turismo do Estado de São Paulo (FecomercioSP) se reuniu com a liderança do Bloco da Maioria do Congresso Nacional e com a assessoria do deputado Aguinaldo Ribeiro (PP/PB), relator do Projeto de Lei (PL) que regulamenta o uso da Inteligência Artificial (IA), para apresentar o seu posicionamento sobre o tema. A conversa faz parte de uma primeira etapa de mobilização da Entidade para garantir uma regulamentação que salvaguarde direitos de propriedade intelectual e de privacidade, sem prejudicar a inovação.
A FecomercioSP elaborou um decálogo com propostas relativas ao PL 2.338/23, que pretende regulamentar a IA. O texto, que já foi aprovado no Senado, volta agora à Câmara dos Deputados, onde será analisado por uma comissão especial a ser instalada no próximo dia 20. Antecipando-se ao início dos trabalhos dessa comissão, o consultor de proteção de dados da Federação, Rony Vainzof, e o presidente do Conselho de Economia Digital e Inovação (CEDI), Andriei Gutierrez, expuseram as premissas da Entidade para o marco regulatório.
Premissas e propostas da FecomercioSP para pautar o debate sobre IA
- IA é elemento primordial para o desenvolvimento econômico e social e para a competitividade: a IA tem se tornado essencial para a sobrevivência e competitividade de países e dos negócios e logicamente não é diferente a sua importância para o Brasil e para o seu setor de Comércio de Bens, Serviços e Turismo, trazendo maior eficiência, com redução de custos e aumento de qualidade no atendimento dos consumidores finais; melhorias em seu controle de estoque e práticas de reabastecimento; na celeridade das entregas; nos sistemas de transporte inteligentes; no atendimento ao cliente, por meio de chatbots e assistentes virtuais, e no marketing e publicidade direcionada, apenas para citar alguns exemplos. Em suma, a IA será cada vez mais o elemento-chave para a redução do custo brasil, o aumento da produtividade das nossas empresas e a geração de riqueza para o país. É essencial que a regulação, na busca legítima por segurança jurídica, não prejudique a adoção da IA pelas nossas empresas.
- A regulação brasileira não pode ser assimétrica em relação ao padrão regulatório dos outros países: entre 2020 e 2023, surgiram os primeiros debates regulatórios consistentes sobre IA no globo. Em outubro de 2023, os EUA estabeleceram ordem executiva presidencial, incluindo restrições para o uso e o desenvolvimento da IA, a qual foi revogada pelo presidente Trump. A União Europeia, por sua vez, finalizou e aprovou o AI Act em junho de 2024, o qual está em amplo debate acerca da sua eficácia e complexidade de implementação. Reino Unido, Cingapura, Austrália e Japão estão mirando cada vez mais como suas futuras regulações tragam segurança jurídica sem prejudicar a competitividade. É essencial que a regulação brasileira não se descole do debate regulatório global para que nossas empresas não sejam prejudicadas com obrigações excessivas e distantes das melhores práticas regulatórias globais.
- Além da regulação, precisamos discutir um Plano de Nação para a era Digital com atenção especial às PMEs: as iniciativas atuais são desconectas e padecem de prioridade política de Estado. Ambas as Estratégias Brasileiras para a Transformação Digital (eDigital) quando para a Inteligência Artificial (eBIA) nunca ganharam relevância de Estado e, a despeito de alguns avanços pontuais (como, por exemplo, na área de governo digital), ainda carecem de falta de recursos e de priorização política. Já o Plano Brasileiro de IA (PBIA) parece ter perdido completamente a tração sem ter saído do papel e ser convertido em decreto. O Brasil não pode se dar ao luxo de não avançar no uso da IA nem se contentar com um papel periférico no seu desenvolvimento. Ser apenas usuário passivo de tecnologias desenvolvidas por outros países, sejam elas aplicadas ou de base, significará perder soberania digital, autonomia estratégica e competitividade global. É urgente a formulação e execução de um Plano de Nação para a IA, que articule governo, setor produtivo, academia e sociedade civil em torno de um projeto de Nação de longo prazo, sustentável e inclusivo. Esse plano deve combinar investimentos robustos em pesquisa, inovação e talentos com ambiente regulatório seguro, ético e promotor de confiança, permitindo o florescimento de ecossistemas nacionais de IA que respeitem os direitos fundamentais e impulsionem o desenvolvimento econômico e social.
- Regular o uso, e não a tecnologia: assim como a máquina a vapor, a eletricidade e a internet, a Inteligência Artificial (IA) é uma tecnologia de propósito geral que está em pleno e constante desenvolvimento. É preciso extrema cautela ao regular tecnologias para que a norma seja suficientemente flexível e adaptável às suas rápidas mudanças, permitindo experimentação, inovação e evolução contínua dos sistemas de IA. Nesse contexto, a regulação deve evitar criar conjuntos de regras específicas para tipos específicos de IA. A regulação da IA, para que seja perene, deve mirar nas condições gerais da sua adoção deixando os elementos regulatórios específicos para tipos de tecnologias para mecanismos infralegais.
- Abordagem principiológica e contextual baseada em riscos: o ponto-chave da regulação deve se voltar à modelação de níveis escalonados de riscos e à criação de salvaguardas proporcionais para a sua mitigação, a depender da aplicação contextual da IA. É pertinente que, no nível legal, sejam traçados os parâmetros gerais de risco para que a sua definição, no âmbito normativo, se dê de maneira contextual, ponderando o risco potencial e as medidas de mitigação disponíveis no momento da regulação. Como a IA é uma tecnologia em estado constante de evolução, a busca por uma regulação efetiva e perene passa necessariamente por conferir flexibilidade para os reguladores poderem regular baseados no contexto do seu uso, assim como nos seus riscos e nas medidas e tecnologias de mitigação disponíveis no momento da regulação.
- Avaliar a aplicação das legislações em vigor e a competência dos órgãos constituídos, assim como a necessidade de coordenação regulatória: como a IA é uma tecnologia de propósito geral, de acordo com o seu uso, será aplicável a determinadas legislações já existentes, como a LGPD, o Código Eleitoral, o Código de Defesa do Consumidor (CDC), o Código Civil, a Lei do Cadastro Positivo e o Marco Civil da Internet (MCI), além da própria Constituição Federal e de regulações setoriais do mercado. Todas essas legislações e códigos já possuem instituições específicas. Isto é, se já há leis aplicáveis tutelando direitos e garantias individuais, que nem sequer foram estressadas para a IA, devemos ter um modelo de governança ágil, que não prejudique oportunidades e a inovação. É necessário que a regulação da IA no Brasil vise uma governança de coordenação das ações regulatórias e políticas públicas, com foco na interoperabilidade regulatória e de padrões para o avanço da IA no Brasil. Desencorajamos, todavia, que esse órgão tenha caráter sancionatório ou fiscalizatório e que essas ações fiquem a cargo dos órgãos competentes, salvo nos casos de modelos de IA considerados de riscos sistêmicos.
- Obedecer ao regime atual das sanções administrativas: de acordo com o respectivo uso da IA, já existem sanções administrativas a serem aplicadas pelos órgãos setoriais competentes, como no CDC, na LGPD, no MCI, entre outras normas. Isto é, qualquer novo regime de sanções criaria um temerário bis in idem.
- Promover a autorregulação regulada: reconhecendo a dinâmica de evolução constante da tecnologia, a inovação e a diversidade de contextos para cada setor de aplicação, apoiamos a adoção de soluções de corregulação ou “autorregulação regulada”, provendo segurança jurídica e proteção de direitos fundamentais. A norma traz parâmetros mínimos de governança no desenvolvimento, no emprego e no monitoramento dos sistemas de IA, capazes de balizar o dever de cuidado a ser tomado. Esses parâmetros mínimos orientarão instituições de autorregulação no desenvolvimento de códigos de conduta específicos para diferentes setores de atividade econômica e de possível emprego da tecnologia, podendo ser reconhecidos posteriormente por autoridades públicas setoriais competentes. Esse expediente é relevante e até mesmo essencial para ajudar a endereçar a busca por melhores práticas de identificação e mitigação de riscos no contexto do rápido avanço da IA nos diferentes setores econômicos.
- Incentivar a inovação responsável: o sistema proposto deve prever mecanismos de benefícios aos agentes virtuosos. Isto é, aqueles que utilizem os sistemas de IA de acordo com os preceitos éticos e regulatórios estabelecidos e, ainda, atuem preventivamente para evitar qualquer tipo de utilização da sua tecnologia de forma enviesada, discriminatória e inapropriada. Ainda, visando à construção de um ecossistema que potencialize iniciativas e estimule a concorrência, sugerimos que a norma promova programas e oportunidades de desenvolvimento para pequenas empresas e startups, inclusive mediante a criação de ambientes controlados de inovação, com sandboxes e hubs regulatórios.
- Amadurecer o debate sobre Direitos autorais e desenvolvimento de modelos de IA: o equilíbrio entre fomentar a inovação e garantir a proteção de direitos autorais é um dos principais desafios da regulação global de IA. Esse é um tema que ainda está longe do consenso. De um lado, é importante garantir que os direitos autorais sejam respeitados. Por outro lado, a quantidade de dados necessários para o desenvolvimento de modelos computacionais mais avançados é imensa de modo a criar dificuldades técnicas, seja para a sua identificação ou remuneração. Dependendo da sua redação, a regulação de IA pode inviabilizar o desenvolvimento de modelos locais de IA e prejudicar a competitividade brasileira na corrida da IA. Encontrar um equilíbrio para esse tema é uma tarefa para a qual o mundo ainda parece não ter respostas, motivo pelo qual parece-nos mais razoável que o tema seja separado da regulação de IA e se torne objeto de projeto de Lei Específica para a atualização da Lei de Direitos Autorais de modo a não prejudicar o avanço da regulação da IA no Brasil.
Clique aqui e acesse o decálogo de IA na íntegra. Acompanhe, ainda, todas as inciativas e novidades da FecomercioSP sobre o tema por meio deste link.