Editorial
29/05/2025Justiça gratuita para quem pode pagar?
Concessão indiscriminada da gratuidade acarreta despesas de bilhões para o erário

Por José Pastore*
A Constituição federal estabelece que os serviços da Justiça são gratuitos para as pessoas que comprovem não ter recursos. A Lei 13.467/2017 modulou essa regra ao dizer que reclamantes que ganham até 40% do teto da Previdência Social (cerca de R$ 3.200) fazem jus à Justiça gratuita. Os que ganham mais do que isso devem comprovar que não dispõem de recursos.
Recentemente, por decisão do Tribunal Superior do Trabalho (TST), a maioria dos juízes passou a conceder a gratuidade de forma generalizada para quem pode e para quem não pode pagar. Resultado: o número de ações trabalhistas explodiu novamente, voltando à situação anterior à reforma trabalhista de 2017 - com mais de 5 milhões de processos.
Examinando vários casos concretos na Justiça do Trabalho, identifiquei várias ações de reclamantes que ganhavam R$ 40 mil por mês e mais, sendo contemplados com a Justiça gratuita. O mesmo ocorre com pessoas que possuem carros, motos e outros bens valiosos (José Pastore e colaboradores, O custo da insegurança jurídica na área trabalhista, São Paulo: FecomercioSP, 2025).
No meu entender, tais decisões configuram uma verdadeira injustiça, além de violarem os princípios da Constituição federal e da Lei 13.467/2017. Nesse campo, a decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) na ADI 5.766 foi interpretada pelo Tribunal Superior do Trabalho como ampla liberdade para a concessão da gratuidade, ignorando a regra mais ampla que é a da Constituição federal.
Assim como não existe almoço grátis, não há Justiça gratuita. Alguém paga. A concessão indiscriminada da gratuidade acarreta despesas de bilhões de reais para o erário.
Em boa hora, o senador Laércio Oliveira (PP/SE) apresentou um substitutivo ao PL 2.239/2022 que certamente ajudará a sanar a desorganização atual ao limitar a gratuidade para os que (1) recebem salário igual ou inferior a 40% do limite máximo dos benefícios do Regime Geral de Previdência Social; (2) são beneficiários de programa social do governo federal; (3) auferem renda mensal de até três salários mínimos; (4) mulheres em situação de violência doméstica e familiar; (5) membros de comunidade indígena; (6) representados em juízo pela Defensoria Pública.
Oxalá o Congresso Nacional aprove logo essa matéria para acabar com as injustiças praticadas pela própria Justiça.
* José Pastore é professor da FEA-USP, presidente do Conselho de Emprego e Relações do Trabalho da FecomercioSP e membro da Academia Paulista de Letras.
Artigo originalmente publicado no jornal O Estado de S.Paulo em 29 de maio de 2025.