Editorial
19/04/2016Limitação nos gastos de campanha evita atos ilícitos, afirma ex-secretário da Receita Federal
Em evento realizado na sede da FecomercioSP, Everardo Maciel reforçou que a reforma no financiamento de campanha vai muito além da origem da doação e deve ter controle de gastos, que já ultrapassa total de R$ 5,1 bilhões
São Paulo, 19 de abril de 2016 - Na campanha eleitoral de 2014, os partidos políticos declararam R$ 5,1 bilhões de custos, contra os R$ 792 milhões, em 2002, segundo o Tribunal Superior Eleitoral (TSE). Sem considerar o Fundo Partidário (R$ 916 milhões, em 2016) e a "gratuidade" dos programas eleitorais e partidários. A elevação das cifras ano a ano e as possíveis reformas no sistema de doações de campanhas eleitorais foram debatidas no Seminário Novos Desafios da Jurisdição Eleitoral, realizado na sede da Federação do Comércio de Bens, Serviços e Turismo do Estado de São Paulo (FecomercioSP), nesta segunda-feira (18/04).
O Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu, no fim do ano passado, declarar inconstitucionais normas que permitem às empresas doarem para campanhas eleitorais. A decisão veio logo após as eleições de 2014, que contaram com diversas companhias doando montantes para políticos de vários partidos. Este fato gerou a teoria da contrapartida, onde as empresas investiam seu dinheiro para receberem retorno em forma de obras públicas e outros favorecimentos. Por isso, a partir das próximas eleições, apenas pessoas físicas poderão realizar doações.
Segundo o juiz federal, Raphael Oliveira, o Brasil é o maior gastador em campanhas eleitorais do mundo. "No país se gasta US$ 2,1 bilhões para atingir 193 milhões de pessoas, valores muito mais elevados do que em países como EUA, França e Alemanha", afirma. Além dos altos gastos, há concentração das mesmas empresas nas doações, como mostra a pesquisa realizada pelo Instituto Ethos, nas eleições municipais de São Paulo em 2012, que aponta apenas 1% dos doadores como responsável por 61% do montante doado aos partidos políticos. Os dez principais financiadores contribuíram com aproximadamente 22% do total arrecadado. Esse grupo, em geral, é constituído por construtoras e bancos. "Outra pesquisa aponta ainda que nos 33 primeiros meses de governo as empresas recebem mais de 800% do valor investido na campanha, ou seja, a compensação existe", pondera Oliveira.
Para o ex-secretário da Receita Federal, Everardo Maciel, a solução para uma reforma no sistema não passa apenas pela proibição de doação por empresários, mas no limite dos gastos com as campanhas. "Se não houver limitação nos gastos de campanha, sempre haverá atos ilícitos, mesmo com a proibição da doação empresarial de campanha", aponta. Para Maciel, além da limitação, deve-se restringir as verbas do Fundo Partidário e a propaganda gratuita dos partidos sem representatividade significativa; limitar o horário gratuito dos candidatos a pleitos majoritários ao da legenda do próprio candidato; restabelecer as regras de suspensão de imunidade dos partidos políticos; eliminar as coligações em pleitos proporcionais; e extinguir o instituto da reeleição para os cargos do Executivo.
Está em tramitação no Senado a PEC no 113ª, de 2015, que altera alguns pontos da proibição da doação empresarial de campanha, bem como permite a contribuição de pessoas físicas ou jurídicas a partidos; veda a doação de pessoas jurídicas a candidatos; limita o acesso aos recursos do Fundo Partidário e aos programas gratuitos de rádio e TV aos partidos que tenham elegido pelo menos um representante, no Congresso Nacional, na eleição anterior. "Ou seja, não adianta se proibir doação aos candidatos, mas permitir aos partidos políticos, que nada mais são do que os próprios políticos. Vamos esperar que o Senado não aprove as alterações", conclui Maciel.
Era da confusão democrática
O último tema presente no seminário debateu as dificuldades que os brasileiros têm para entender e praticar a democracia, além de distorções presentes no quadro político atual que dificultam seu pleno exercício. O presidente da Academia Paulista de Letras Jurídicas (APLJ), Ruy Altenfelder, expôs o inchado quadro de partidos políticos existentes no País e propôs levar o tema da reformulação do sistema partidário brasileiro para o próximo encontro com o vice-presidente (possível futuro presidente), Michel Temer, que também é membro do Conselho Superior de Direito da Federação. Atualmente são 41 siglas partidárias registradas no Tribunal Superior Eleitoral.
Segundo o presidente da Academia Internacional de Direito e Economia (AIDE), Ney Prado, a sociedade brasileira segue o movimento pendular de eleger governos autoritários ou populistas, mas todos defendem a democracia sem saber ao certo o que ela representa. "Defendemos a democracia, mas ao mesmo tempo temos sérias dúvidas sobre seus objetivos fundantes e seus processos. Como os brasileiros podem gozar da democracia, seus direitos e deveres, se não têm visão nítida sobre os papéis ocupados pelos agentes democráticos?", questiona. Então, segundo Prado, a reforma política precisa ser feita desde a base da população, para identificar quais são os seus desejos, e no sistema político no geral. "Cada um tem sua reforma ideal na cabeça, mas não existe uma fórmula perfeita. O que existe é a reforma possível", aponta.
Seminário Novos Desafios da Jurisdição Eleitoral
O evento ocorrido nesta segunda-feira (18/04), na sede da FecomercioSP, reuniu ministros, juristas, desembargadores e advogados que discutiram os rumos da jurisdição eleitoral no Brasil. Marcaram presença o presidente do Conselho Superior de Direito da Federação, Ives Gandra Martins; o presidente da Academia Internacional de Direito e Economia (AIDE), Ney Prado; o vice-presidente do TRF da 3ª região, desembargador federal Mairan Maia; o ex-ministro do STF, Nelson Jobim; a desembargadora federal do TRF 3ª região/ TRE-SP, Marli Ferreira; os ministros do TSE, Henrique Neves da Silva e Torquato Jardim; entre outras figuras ilustres.
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