Legislação
11/03/2016Crise e desemprego reforçam debate sobre a flexibilização das leis trabalhistas
Mercado de trabalho brasileiro funciona baseado em regras antigas, quando não havia as diferentes formas de atuação nem apoio da tecnologia, dizem especialistas

Para especialistas, regras precisam ser adaptadas à nova realidade do mercado para estimular economia
(Arte/TUTU)
Por Jamille Niero
Em um cenário econômico de aumento do desemprego - em 2015, foram fechadas 1,54 milhão de vagas formais no País, segundo o Ministério do Trabalho - o debate sobre a flexibilização das leis trabalhistas volta a ganhar fôlego.
Para alguns especialistas em relações de trabalho, o mercado de trabalho brasileiro funciona baseado em regras criadas décadas atrás, quando o mundo era muito diferente e não contava com as diferentes formas de atuação nem com o apoio da tecnologia atual.
"A relação entre capital e trabalho está muito dinâmica, as tecnologias estão exigindo novas formas de trabalhar, é imprescindível a criação de um ambiente favorável para que essas formas alternativas de trabalho sejam aplicadas com segurança e proteção necessária ao trabalhador. Não podemos ficar restritos a regras que amarram e comprometem a competição global sob o pretexto de proteger o trabalhador. Essa insegurança, além de gerar custos adicionais, inibe a contratação de novos trabalhadores", considera o advogado e assessor do Conselho de Emprego e Relações do Trabalho da FecomercioSP, Romeu Camargo.
Segundo ele, medidas como terceirização e flexibilização da jornada de trabalho são opções viáveis tanto para a empresa como para os trabalhadores e "podem ocorrer com negociação entre empresa, sindicato e empregado", diz, reforçando que o trabalhador sempre pode contar com o respaldo do sindicato da categoria para tirar dúvidas e buscar esclarecimentos.
"É uma realidade e não podemos tapar o sol com a peneira. Temos regras para preservar os direitos dos trabalhadores e ninguém quer retirar isso. Queremos criar condições para um novo mercado e uma nova economia mundial, com formas criativas de contratar e proteger as pessoas", diz Camargo.
Medidas emergenciais
Em 2015, o governo anunciou o Programa de Proteção ao Emprego (PPE), no qual as empresas poderiam adotar a diminuição da jornada de trabalho com redução salarial como medida emergencial em tempos de queda da atividade econômica. A ação é temporária, mas resgata a discussão da flexibilização.
Para o sócio e diretor de RH do Cavalcante Ramos Advogados, Victor Hugo Freitas de Oliveira, em toda situação de incerteza, como o cenário de crise econômica atual, ações de flexibilização como o PPE podem ser alternativas, já que visam desestimular demissões em empresas com dificuldades financeiras momentâneas. Mas ele explica que a jornada de trabalho máxima e a irredutibilidade do salário são invioláveis, protegidos pela Carta Magna e a Consolidação das Leis do Trabalho (CLT).
"Diante do presente cenário, outras medidas poderão (e deverão) vir a serem adotadas nos mais diversos setores, como a aprovação do projeto que trata da terceirização, inclusive na atividade-fim", diz Oliveira.
Segundo o advogado, tais mudanças permitem ganhos de eficiência na produção, ajudando as corporações a superar momentos de crise. "Apesar da alocação de recursos do Fundo de Amparo ao Trabalhador para custear o PPE, são ações que estimulam a economia do País num momento em que o desemprego está subindo em razão da crise."
Ele lembra ainda que a saída ajuda companhias a manter ou recuperar o equilíbrio financeiro e também desestimula as demissões, contribuindo para preservar o saldo do FGTS do trabalhador e reduzindo o impacto nas arrecadações do INSS, do Imposto de Renda e de outros tributos indiretos. De modo geral, auxilia a recuperação da economia, porque o empregado continua consumindo.
Outras opções
Como a CLT não permite a flexibilização, as decisões da Justiça do Trabalho seguem o mesmo raciocínio. Por isso, uma opção para os interessados em formatos de relações de trabalho mais flexíveis é o contrato de trabalho. Para a coordenadora do curso de Direito da Faculdade Especializada em Direito (Fadisp), Andrea Antonacci, o contrato é livre entre as partes, que podem adotar medidas mais convenientes - como o trabalhador entrar mais tarde e sair mais tarde, banco de horas, entre outros. "O contrato é livre, desde que não contrarie as regras da CLT", avisa a coordenadora.
Ela explica que, para algumas profissões, é uma saída mais fácil, como é o caso de operadores de telemarketing, digitadores ou gestores, que podem trabalhar de casa, uma vez que dependem apenas de ferramentas como telefone ou computador. Por outro lado, é mais difícil em casos como recepcionistas e funcionários da linha de produção de fábrica, pois são funções nas quais é necessário a pessoa estar presente no local. "Há funções que são possíveis, outras não", diz Andrea.
A coordenadora de Direito da Fadisp alega que a CLT não é tão engessada. "Há possibilidades de melhorar sempre. Mas não dá para afastar nem direitos nem obrigações."
Para Andrea, a possibilidade de maior liberdade de negociação entre empresas, sindicatos e empregados sem tanta interferência da Justiça pode ser benéfica, contanto que haja cuidado com o trabalhador. "Mas há acordos que visam defender mais a empresa e, nesses casos, a Justiça não considera esses acordos. As medidas válidas são aquelas nas quais sejam garantidos direitos básicos do trabalhador", afirma.
Para Victor Hugo Freitas de Oliveira, a CLT precisa ser modernizada, para que as relações de trabalho possam se ajustar às novas realidades da economia e restaurar a confiança do mercado e dos consumidores, estimulando o emprego, reduzindo a informalidade e protegendo o trabalhador.
"A flexibilização deve focar no aumento das possibilidades de acordos negociados entre empresa e empregados, com a alternativa de o empregador conceder algumas vantagens compensatórias em troca de adotar procedimentos distintos de certas hipóteses previstas na CLT", diz o sócio do Cavalcante Ramos Advogados.
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