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Legislação

Mudanças no ICMS sobre combustíveis torna sistema tributário ainda mais complexo e não diminui preços

Lei complementar pode resultar em aumento da carga em alguns Estados e perda de arrecadação em outros

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Mudanças no ICMS sobre combustíveis torna sistema tributário ainda mais complexo e não diminui preços

Para Márcio Olívio Fernandes da Costa, presidente do Codecon-SP, o ideal seria acelerar o processo de simplificação tributária
(Arte: TUTU)

Por Filipe Lopes

Na busca pela redução dos preços dos combustíveis, que sobem vertiginosamente a cada dia que a Guerra na Ucrânia perdura, foi sancionada, em 11 de março, a Lei Complementar 192/2022, que altera o ICMS sobre os combustíveis. A decisão, porém, gera discussões não apenas sobre sua eficácia, mas, principalmente, por alterar de maneira profunda, as características gerais do imposto, que passará a ser monofásico, com alíquota única para todos os Estados, e não será mais calculado sobre o preço dos combustíveis (valor médio na bomba), mas sobre a unidade de medida.

Todos os detalhes a respeito das mudanças no ICMS sobre os combustíveis foram discutidos por José Clóvis Cabrera, especialista na área tributária, durante reunião virtual do Conselho Estadual de Defesa do Contribuinte de São Paulo (Codecon-SP), ocorrida na última quinta-feira (24).

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A referida legislação estabelece as novas regras para a cobrança do ICMS sobre gasolina e etanol anidrol; diesel e biodiesel; e gás liquefeito de petróleo, inclusive o derivado do gás natural. Também concede isenção de PIS/Pasep e Cofins deste ano sobre os combustíveis, mas garante a manutenção dos créditos vinculados aos contribuintes.

Na prática, porém, já é possível enxergar distorções na busca pela diminuição dos preços nas bombas de combustíveis. O Conselho Nacional de Política Fazendária (Confaz) fixou, por meio do Convênio ICMS 16, publicado na mesma data em que a reunião do Codecon-SP foi realizada, alíquota de R$ 1,0060 do ICMS sobre o diesel SL10, o mais utilizado no Brasil, a partir de 1º de julho, para todos os Estados e o Distrito Federal (DF). Enquanto isso, o ICMS a ser recolhido sobre o preço final da gasolina, etanol e gás de cozinha foi prorrogado por mais 90 dias, ou seja, até 30 de junho de 2022.

Esta determinação poderia aumentar a carga tributária sobre o diesel S10 em nove Estados (incluindo São Paulo) e na capital nacional, já que as alíquotas praticadas nestes locais são menores do que o novo parâmetro aprovado pelo Confaz. A solução encontrada foi criar um incentivo fiscal para que a carga do combustível permaneça a mesma praticada atualmente. Isto é, a medida só terá o efeito de redução nos preços do diesel quando o valor estipulado for menor do que o praticado hoje nos Estados.

Inconstitucionalidades

A decisão chama a atenção de muitos governadores, que terão de abrir mão de importante montante para manter a nova metodologia do ICMS sobre os combustíveis. Muitos questionam a constitucionalidade desta lei, por alterar a essencialidade do imposto: seletividade, não cumulatividade, e possibilidade de diferentes alíquotas para cada Estado incidentes sobre o preço.

Entretanto, a Emenda Constitucional 33, de 2001, incluiu a alínea “h” no inciso XII, do §2º, do artigo 155, da Constituição Federal (CF), que trouxe a previsão de que cabe a lei complementar definir a cobrança única de imposto sobre combustíveis e lubrificantes, qualquer que seja sua finalidade.

Outro ponto discutido pelos Estados é a autonomia para repartir o imposto sobre os combustíveis, que, segundo a mesma EC 33/2001, deve ser feita entre os Estados de origem e de destino:

“II - Nas operações interestaduais, entre contribuintes, com gás natural e seus derivados, e lubrificantes e combustíveis não incluídos no inciso I deste parágrafo, o imposto será repartido entre os Estados de origem e de destino, mantendo-se a mesma proporcionalidade que ocorre nas operações com as demais mercadorias;”

Outra inconstitucionalidade está no inciso IV, do artigo 3º da Lei Complementar 192/2022, senão vejamos:

“IV - Nas operações interestaduais com combustíveis não incluídos no inciso II deste caput, destinadas a não contribuinte, o imposto caberá ao Estado de origem; ”

A regra conflita com o inciso VII, do § 2º, do art. 155, da EC 87, de 2015, que confere o Diferencial de Alíquota do ICMS (DIFAL/ICMS) ao Estado de destino, qualquer que seja o destinatário das mercadorias, contribuinte ou não contribuinte, vide abaixo:

“VII - Nas operações e prestações que destinem bens e serviços a consumidor final, contribuinte ou não do imposto, localizado em outro Estado, adotar-se-á a alíquota interestadual e caberá ao Estado de localização do destinatário o imposto correspondente à diferença entre a alíquota interna do Estado destinatário e a alíquota interestadual;”

Para Cabrera, provavelmente o ICMS combustíveis será questionado no judiciário. “Seria muito mais proveitoso discutirmos a adoção gradual de um IVA [Imposto sobre Valor Agregado] do que a transformação do ICMS sobre combustíveis em monofásico”, afirmou.

Relevância para estados

O estabelecimento de alíquota única pode prejudicar Estados que dependam do ICMS oriundo dos combustíveis, uma vez que, segundo Cabrera, o imposto representa enorme fatia na composição orçamentária dos entes federativos. “Em São Paulo, o imposto sobre os combustíveis representa cerca de 14% da arrecadação do Estado, apesar da diversidade arrecadatória paulista. Já em outras regiões, o recolhimento do ICMS sobre combustíveis chega a representar um terço da arrecadação total”, ponderou o tributarista.

Lei de Responsabilidade Fiscal

A decisão de diminuir o ICMS sobre os combustíveis também esbarra na Lei Complementar 101/2000, conhecida como “Lei de Responsabilidade Fiscal”, que controla os gastos públicos, condicionando-os à capacidade arrecadatória do Estado.

Uma vez que a alíquota dos combustíveis será uniforme, alguns Estados podem apresentar aumento nos preços de alguns produtos, caso o cálculo escolhido estabeleça porcentagem maior do que os entes praticam atualmente.

“O diesel, por exemplo, pode sofrer alta em São Paulo e queda no Acre, que pratica alíquota de ICMS na casa dos 25%. No caso paulista, o aumento da carga tributária seria um contrassenso da Lei Complementar, que pretende diminuir os preços dos combustíveis para o consumidor, mas o resultado seria o oposto. Já no cenário de queda de arrecadação no Acre, como o governo fará para equilibrar suas contas e cumprir a Lei de Responsabilidade Fiscal? ”, questionou Cabrera.

Colcha de retalhos

Para Márcio Olívio Fernandes da Costa, presidente do Codecon-SP, o ideal para o País seria acelerar o processo de simplificação tributária a fim de conferir mais dinamismo e segurança jurídica às atividades econômicas. “Costurar mais um remendo na complexa legislação tributária brasileira não seria tão eficaz quanto uma reforma enxuta, simplificada, séria e verdadeiramente de acordo com os interesses da Nação, e não apenas por interesses políticos, que não resolve o problema da elevada carga tributária, em especial no que tange à específica questão do preço dos combustíveis”, ponderou Costa, que também é presidente do Conselho de Assuntos Tributários (CAT) da Federação do Comércio de Bens, Serviços e Turismo do Estado de São Paulo (FecomercioSP).

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