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Editorial

Os fatos escondidos nos dados do IPCA

Especialista aponta tecnicamente os motivos da contradição nos dados do índice

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Os fatos escondidos nos dados do IPCA
"O Bacen não deve apenas cuidar da inflação presente, mas também assegurar aos agentes econômicos comprometimento suficiente para que essa inflação siga uma dinâmica sustentável no futuro", escreve (Arte: TUTU)

Por André Sacconato*

O último resultado do Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), referente ao mês de abril, apontou inflação de 0,61%. Embora seja melhor que os dados de março (0,71%) e de abril do ano passado (1,06%) — além da queda, em 12 meses, de 4,18% —, ainda assim, é sinal negativo para o Banco Central (Bacen) quanto ao seu esforço de combate à inflação. É necessário entender tecnicamente o motivo desse aparente paradoxo.

O primeiro fato é que, apesar da queda consistente, a análise do índice de 12 meses esconde um perigo. Por causa das desonerações pontuais do combustível e da energia, os índices de julho, agosto e setembro de 2022 foram a -0,68%, -0,36% e -0,29%, respectivamente.

Em julho, agosto e setembro de 2023, a troca do índice fará com que o IPCA de 12 meses suba imediatamente. Expurgados esses pontos, o valor de um ano deve subir para 6%, muito longe da meta de 3,25% — e mesmo fora da banda superior de 1,5%.

Outro fato que precisa ser esclarecido: a inflação que mede com mais precisão o aquecimento da demanda é a de serviços. Nos Estados Unidos, existe o conceito core inflation, que isenta preços muito voláteis. Como no Brasil não temos essa concepção, usa-se muito a inflação dos serviços, a qual, em um ano, se aponta 7,49%, um ponto-chave que explica a ausência da baixa de juros permanente — no entanto, o importante é entender por que que esse índice é o mais relevante.

Podemos dividir o indicador de inflação em três componentes: expectativas, inflação de demanda e choques. Deixaremos para falar do primeiro mais adiante. Agora, o primordial é entender a diferença entre choques e demanda. Imagine, por exemplo, uma quebra na safra de arroz e uma expressiva mudança no patamar de preços.

Quando tudo voltar ao normal, provavelmente o arroz devolverá essa mudança, e não há nada que o Banco Central (Bacen) poderá fazer a respeito. Nesse caso, de nada adiantaria mudar o patamar da taxa de juros. Já a demanda talvez seja o componente central. Se as pessoas estão consumindo mais do que a economia pode produzir em pleno emprego, o crescimento da procura atinge o ponto de custo crescente das empresas e acarreta inflação progressiva.

Aqui, os serviços são os mais sensíveis a esse aumento nos custos aos consumidores, já que dificilmente sofrem choques de oferta. Assim, ao ganhar mais, a população consome mais viagens, cabeleireiros e restaurantes de forma imediata. Por isso, a inflação dos serviços é o termômetro perfeito da inflação de demanda — e exige ação da autoridade monetária. Os bancos centrais se atentam mais a esse índice do que ao cheio, mais um motivo para cautela com juros.

Voltemos ao primeiro componente: as expectativas. O Bacen não deve apenas cuidar da inflação presente, mas também assegurar aos agentes econômicos comprometimento suficiente para que essa inflação siga uma dinâmica sustentável no futuro.

A política de juros também pode mostrar isso, posto que também reafirma esse compromisso com a inflação presente e com a dinâmica temporal. Por essa razão, a autoridade monetária precisa usar o instrumental de juros para ancorar as expectativas.

Em suma, é crucial analisar a inflação de demanda, representada pelos serviços, e as projeções de inflação de médio e longo prazos, pois nenhuma ainda está dentro da banda superior. O Bacen tem muito trabalho pela frente.

*André Sacconato é economista, consultor da FecomercioSP e integrante do CEEP.
Artigo originalmente publicado no Portal Contábeis em 18 de maio de 2023.

Saiba mais sobre o Conselho de Economia Empresarial e Política (CEEP).

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